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quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

DIREITO E RAZÃO NO GARANTISMO PENAL


Erivelton Lago

Advogado Criminalista
Presidente da Associação dos Advogados Criminalistas do Maranhão-ACRIMA



Ferrajoli é ex- magistrado e professor de filosofia na Universidade de Camerino- Itália. Na obra Direito e Razão ele discute a forte crise de legitimidade: morosidade, sensação de impunidade, ineficácia da sanção e descrédito na justiça.

Ele discute a proteção de direitos emergentes como a genética, informática, consumo de alimentos, redefinição de antigos crimes como descaminho e lavagem de capitais no âmbito internacional.

A obra discute o sistema penal em suas bases filosóficas, epistemológicas, éticas e sociológicas e jurídicas. Destrói velhas teorias para construir uma teoria do garantismo como modelo ideal, um sistema normativo DOTADO GARANTIAS que tragam racionalidade a partir da qual deverão ser analisados os problemas DA PENA, DO CRIME E DO PROCESSO PENAL.

Direito e razão é uma exploração continuada de diversas disciplinas jurídicas e especialmente o direito penal. É uma reflexão nutrida de estudos filosóficos e históricos sobre os ideais morais que inspiram o direito das nações civis.

A aposta é grandiosa: é a elaboração de um SISTEMA GERAL DE GARANTISMO, ou se preferir, a CONSTRUÇÃO DE VIGAS-MESTRAS do estado de direito que tem por escopo e fundamento a tutela da liberdade do indivíduo contra as várias formas de exercício arbitrário do poder particularmente o odioso direito penal. O engraçado em tudo isso, é que os promotores pedem punições sem analisar estas questões, a de que a supressão da liberdade começa no momento em que o direito deixa o cidadão sem trabalho, escola e alimento para prendê-lo depois.

O livro rever e analisa os conceitos do iluminismo do séc. XVIII que faz a relação entre poder e liberdade, pois sabe-se que quanto maior a liberdade menor o poder e quanto maior o poder menor a liberdade.

O poder deve ser limitado de modo a permitir a cada um de nós gozar ao máximo a liberdade compatível com a igualdade. Todas as antíteses nascem da antítese poder versus liberdade. A começar na esfera do direito penal pela antítese entre modelo autoritário e modelo e modelo garantista; entre as antíteses garantismo e decisismo; Direito penal mínimo e direito penal máximo(pena de morte)...direito do mais forte e direito do mais fraco etc.

A obra tenta extrair dos resultados obtidos na descrição do modelo garantista do direito penal os lineamentos de um modelo geral de garantismo: elevando-o a um modelo ideal de estado de direito entendido como estado protetor dos direitos das liberdades individuais e sociais.

O estado jamais será um fim em si mesmo. O estado é um meio que tem por fim a tutela do ser humano, de seus direitos fundamentais, de seus direitos sociais á moradia, alimentação, saúde, da liberdade e da segurança social.

A obra inteira explica uma contraposição entre a concessão técnica e a concessão ética do estado e de todas as instituições. Um dos inimigos mortais do garantismo é o estado ético de Hegel. A obra combate as medidas de segurança, o encarceramento preventivo, transação entre juiz e imputado. Sopra dentro da obra o espírito vivificador que emana de uma ética de liberdade sinceramente vivida. É uma luta pelo respeito à legalidade.

O livro contribui para uma crítica reflexiva sobre a crise da legitimidade que assola os modernos sistemas penais. A obra mostra que o direito penal sempre foi o centro da reflexão jurídico-filosófica. A pena é de fato uma segunda violência que se acrescenta ao delito e que é programada e executada por uma coletividade organizada contra um indivíduo solitário.

A obra leva à análise de Beccaria quando ele diz: “a propriedade privada é um terrível e desnecessário direito. A obra leva à análise de Montesquieu quando diz: “o poder de punir e de julgar resta seguramente o mais terrível e odiosos dos poderes, aquele que se exercita de maneira de maneira mais violenta e direta sobre as pessoas e no qual se manifesta de forma mais conflitante o relacionamento entre o estado e o cidadão entre a autoridade e a liberdade, entre a segurança social e a liberdade individual. É por isso que o direito penal sempre foi o centro da reflexão jurídico-filosófica.

A obra trata a “razão” no sentido de razão no direito; razão do direito e razão de direito penal. Razão no direito é a racionalidade das decisões penais, do sistema de regras elaborado pela tradição liberal. Nesse aspecto o direito penal garantista equivale a um sistema de minimização do poder e a maximização do saber judiciário condicionador da validade das decisões à verdade empírica.

A obra trata “razão” no sentido axiológico e político da palavra. Faz uma filosofia do direito, da justiça penal. Trata das justificações éticas e políticas da qualidade, quantidade, finalidade e necessidade da pena. É o modelo penal garantista assegurado pelos princípios da estrita legalidade e jurisdicionalidade.

Em um terceiro momento razão designa o tema pertencente à ciência penal. pertence à teoria geral do direito penal dogmático. O modelo penal garantista foi recebido, mesmo de maneira sumária e lacunosa, pelo nosso ordenamento jurídico constitucional.

O livro faz uma reflexão teórica sobre estas três ordens de razão. Faz uma revisão do sistema garantista de legalidade penal e processual que foi traçado pelo iluminismo do séc. XVIII. Sabe-se que o pensamento iluminista foi o ponto mais alto da história do direito penal. Ao iluminismo se deve a formulação da maior parte das garantias penais e processuais do estado de direito. Por outro lado, o esquema garantista transmitido por ele foi baseado sobre a idéia do julgamento como silogismo perfeito e do Juiz como a boca da lei. Tal fato terminou por se tornar o símbolo da fraqueza política devido a falta de reflexão sobre o direito penal e as causas do crime e da criminalidade. Hoje existem juizes que não vêem isso, apenas julgam e penalizam sem o mínimo de reflexão sobre a sua obra sentencial.

A tarefa da teoria do garantismo penal é fazer uma revisão crítica da epistemologia jurídica iluminista. A crise do garantismo penal iluminista é produto de sua fragilidade epistemológica e do ofuscamento de seus fundamentos axiológicos do silogismo irreflexivo.

O atual Estado de direito fundamentou-se no combate ás práticas do séc. XVII. O despotismo punitivo veio dando lugar ao jusnaturalismo iluminista que lutou contra a intolerância religiosa e contra o arbítrio repressivo. O garantismo vem criticar esse modelo e busca o respeito à lei, à pessoa humana, à vida e à liberdade.

A obra trata do problema do crime, da pena e do processo sob as bases dos três quartetos de interrogações: se, como, porque e quando punir. Se, como, porque, e quando proibir; se, como, por que e quando julgar.

Os princípios sobre os quais se fundamenta o garantismo clássico: legalidade estrita, a materialidade, lesividade dos delitos, a responsabilidade pessoal, contraditório entre as partes, presunção de inocência são, em grande parte, fruto da tradição jurídica do iluminismo e do liberalismo.

De certo modo o convencionalismo penal e legalidade estrita resulta do princípio da legalidade estrita na determinação abstrata do que é punível. O princípio da legalidade exige o caráter formal ou legal do critério de definição do desvio e o caráter empírico ou fático das hipóteses de desvio legalmente definidas.

O desvio punível não é o que por características intrínsecas é reconhecida em cada ocasião como imoral, anormal, socialmente lesivo etc. Desvio punível é aquele formalmente indicado pela lei como pressuposto necessário para a aplicação da pena segundo a fórmula: nulla poena et nulla crimen sine lege.

Por outra parte, a definição legal de desvio punível deve ser produzida não com referência à figura do autor, mas somente às figuras empíricas e objetivas de comportamento, segundo a outra máxima: nulla poena sine crinine et sine culpa.

Na verdade o princípio da legalidade depende de duas condições que se resumem no princípio da reserva legal que em matéria penal submete o Juiz à lei e a segunda condição é o caráter absoluto da reserva da lei penal, em virtude da qual o Juiz a submissão do Juiz é somente à lei.

A obra denomina de princípio de mera legalidade(é a norma dirigida aos juizes) o princípio da reserva legal; e, por outro lado, denomina de princípio de estrita legalidade(é a norma dirigida ao legislador) o princípio da reserva absoluta da lei.

O princípio da legalidade estrita é proposto como técnica legislativa específica dirigida a excluir as convenções penais arbitrárias e discriminatórias que punem não os fatos, mas as pessoas e, portanto de caráter constitutivo e não regulamentar daquilo que é punível: é com era as normas no passado que promoviam a caça às bruxas, perseguição aos hereges, os judeus, os subversivos, os inimigos do povo, perseguição aos desocupados, aos vagabundos, aos propensos a delinqüir, os socialmente perigosos.

Recentemente o direito penal aplicou uma distinção na teoria geral do direito dizendo que o princípio da estrita legalidade não admite normas constitutivas, mas somente as regulamentares do desvio punível.

Obs. exemplo de silgismo,: A sentença, que deve ser prolatada na forma de um silogismo, obedece a premissa menor, passando pela premissa maior até se chegar à conclusão. Dessa forma, se o Estado-juiz, para chegar à conclusão (comando - parte dispositiva), não tenha se utilizado do erro de fato quando adentrou na premissa menor (relatório) e, especialmente, na premissa maior (fundamentação, analisando as questões de fato e de direito - inc. II, do art. 458), no se pode considerar, assim, essa sentença como objeto de uma futura ação rescisória.

silogismo jurídico: (premissa maior: lei; premissa menor: fato; e síntese ou conclusão: a sentença).veta

Todo o esquema epistemológico até aqui ilustrado e o modelo penal garantista que nele se informa tem o defeito de corresponder a um modelo idealista irrealizável. O Juiz não é uma máquina automática na qual por cima se introduzem os fatos e por baixo se retiram as sentenças. A idéia de um silogismo judicial perfeito, que permite a verificação absoluta dos fatos legalmente puníveis, corresponde a uma ilusão metafísica.

As condições de uso do termo verdadeiro e os critérios de aceitação da verdade no processo exigem inevitavelmente decisões dotadas de discricionariedade. Assim, o sistema de garantias penais nunca é absolutamente certo e objetivo.

É incompatível com a epistemologia garantista, a ideologia mecanicista da aplicação da lei expressada na célebre frase de Motesquieu: “os juizes da nação não são mais do que a boca que pronuncia as palavras da lei, seres inanimados que não podem moderar nem a força nem o rigor das leis.”. Essa frase traduz uma verdade que muito se tem observado no comportamento de juizes inanimados e robotizados.

Direito e razão, bom prá se ler...

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